
O Teatro Amazonas perdeu, nesta terça-feira, um de seus maiores símbolos. Raimundo Nonato Pereira do Nascimento, conhecido com carinho por todos como “Seu Nonato”, faleceu aos 89 anos, deixando um legado de 52 anos de dedicação ao maior ícone da cultura do Amazonas.
O secretário de Estado de Cultura e Economia Criativa, Caio André, destacou a importância de seu Nonato na construção da história do Teatro Amazonas e ressalta que ele deixa um legado majestoso para o templo cultural e para a história do Amazonas.
“Hoje é com muita tristeza, que nós recebemos a notícia do falecimento do seu Nonato, este grande servidor da Secretaria de Cultura e Economia Criativa do Estado, principalmente do Teatro Amazonas. Uma figura icônica, que dedicou a sua vida à cultura do Estado, principalmente deste que é a nossa maior referência de espaço público cultural que é o Teatro Amazonas. E nós queremos aqui dizer à família e aos amigos que estamos dando a eles as nossas condolências, na certeza de que ele será recebido pelo nosso Pai, no céu, que tem com certeza um lugar guardado para ele”.
Filho de um ajudante de pedreiro e de uma lavadeira, Seu Nonato nasceu em 26 de fevereiro de 1935 e entrou para a história do Teatro Amazonas em 1973, quando foi contratado para trabalhar na reforma do edifício centenário. Começou como pedreiro, ajudando a recuperar a cúpula e assentando o piso de mármore do hall de entrada, que permanece firme até hoje. A partir dali, nunca mais se afastou.
Ao longo dos anos, assumiu diversos papéis dentro da casa: pedreiro, porteiro, bilheteiro, indicador, assistente técnico, agente administrativo e cenotécnico. Era, como diziam os colegas, um verdadeiro “coringa” do teatro. Mas seu lugar favorito sempre foi o palco. Era dali que dizia aprender todos os dias, com cada peça, cada ensaio, cada espetáculo.
Em 2019, esse amor e dedicação foram reconhecidos oficialmente durante a abertura do 22º Festival Amazonas de Ópera. Raimundo Nonato foi homenageado com uma placa que hoje repousa na galeria do Teatro, ao lado de artistas que marcaram a história da cultura amazonense.
Em 2021, sua trajetória virou artigo acadêmico, escrito por um doutorando da Universidade do Estado de Santa Catarina para a revista Luz em Cena. Intitulado “Raimundo Nonato: Um conhecimento técnico construído na prática e no amor ao Teatro Amazonas”, o texto registrou com sensibilidade o valor humano e cultural do trabalhador autodidata que conhecia cada fresta do prédio histórico.
Histórias não faltam para contar. Seu Nonato lembrava com orgulho o dia em que, ainda no início, foi chamado para substituir um colega apavorado diante de uma pedra de mármore. Fez o trabalho com tanta segurança e habilidade que seu patrão não pensou duas vezes antes de lhe oferecer um salário maior.
Também ficou marcado pela visita do então presidente João Figueiredo, nos anos 1980. Vestiram-no com um terno, colocaram-no na linha de frente, e ele acabou sendo o anfitrião do presidente da República. “Eu era o único preto no meio dos brancos. Quando ele me cumprimentou, fiquei muito feliz”, recordava, com brilho nos olhos.
Mais tarde, também testemunhou momentos tocantes, como a visita do então príncipe Charles, hoje rei do Reino Unido. Ele chegou no palco sorrindo, cantou, e abraçou as senhoras da limpeza, que estavam com as vassouras nas mãos.
Seu Nonato parte, mas deixa uma presença permanente nos corredores, nas coxias, nos camarins e na alma do Teatro Amazonas. Seu nome ecoa junto à sua voz mansa e firme, entre as paredes que ajudou a erguer, conservar e iluminar com sua humanidade.
Velório
O início da cerimônia está previsto para acontecer a partir das 10h30 desta terça-feira (03/06), no Teatro Amazonas. O sepultamento será às 10h de quarta-feira (04/06) no Cemitério Recando da Paz, no município de Iranduba, na região metropolitana de Manaus.