Os desafios da distinção entre direita e esquerda na atualidade

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Por Carlos Santiago*

     Nos países declarados de regime democrático existem embates sociais, midiáticos, econômicos e eleitorais envolvendo o espectro político esquerda-direita, o que não é novidade nem para a história da sociedade contemporânea, nem para os espaços de produção acadêmica e científica e de comunicação jornalística, levando ao desafio de apreender essa questão em face de cenário de grandes transformações nas últimas décadas.

      O contexto histórico atual, numa modernidade em que Bauman (2001) denomina de “líquida”, não existe nada sólido, tudo se dissolve com fluidez, com as novas formas de relacionamentos, com os novos modelos de participação da população no regime democrático, com novos modos de perceber o poder, com os avanços das tecnologias da informação modernas, com a revolução no processo produtivo e no mundo das relações de trabalho, com os conflitos e harmonias entre culturas, com o pluralismo partidário, com o surgimento de líderes populares que crescem por meio da internet, além da massificação da comunicação digital trazem desafios para explicar o significado e a distinção entre direita e esquerda nas primeiras décadas do século XXI.

      A história mostra que em 1789, na Assembleia Constituinte da França, a questão já não era somente a localização das cadeiras à direita ou à esquerda, mas também posições distintas expressadas nas votações e nos discursos, em que representantes da burguesia abastada sentados à direita defendiam a propriedade e a liberdade econômica com poucas mudanças sociais, políticas e a manutenção de poderes da monarquia, como os girondinos; enquanto os que se sentavam à esquerda representavam a burguesia média e as classes populares, buscavam mudanças significativas, como fundar uma “república no bem comum e no interesse coletivo, por sentirem-se excluídos, subjugados” (Sader, 1995, p.25).

      A dicotomia política atravessou os séculos XIX e XX, passando por duas grandes Guerras Mundiais, pela libertação de países e de povos de sangrenta colonização europeia, pelo surgimento e fim de estados com regimes autoritários e totalitários, de esquerda e de direita, e sobreviveu ao término da União das Repúblicas Socialistas Soviéticas e a queda do muro de Berlim, em 1989, chegando aos dias atuais, como oposições políticas (Fausto, 2011; 2012 p.1). E, de forma mais intensas, nas décadas 70, 80 e 90 quando mudaram, novamente, motivados por uma nova economia e redefinição do papel do Estado, visto que “os conceitos do que é esquerda e direita, do que é novo e do que é velho, mudam histórica e geograficamente” (Bresser-Pereira, 2000, p.144).

     Entretanto, existiram manifestações partidárias, defesas de governantes de países capitalistas desenvolvidos e em desenvolvimentos, apoio de intelectuais das ciências sociais e da literatura, alimentando uma ideia de Terceira Via política, nos primeiros anos da década de 1990, a fim de superar a dualidade tradicional de direita-esquerda, que nas décadas anteriores representava contraposições entre o neoliberalismo com destaque para o mercado e o socialismo com forte presença do Estado e no planejamento econômico (Giddens, 2007). Apesar disso, a Terceira Via não superou essa dicotomia.

       Pensadores de diferentes áreas do conhecimento vêm empreendendo esforços para explicar razões e significados em envolvem a dualidade entre esquerda-direita na contemporaneidade. Bobbio (1909-2004) , por exemplo, diante do desfecho dos últimos regimes autoritários da Europa, a saber, o franquismo na Espanha e o salazarismo em Portugal, o pós-queda do muro de Berlin, busca explicar razões e significados de esquerda e de direita utilizando uma metodologia analítica, ao analisar trabalhos acadêmicos, fatos históricos, materiais jornalísticos e conceitos de liberdade, de democracia, de conservador, de progressistas e de igualdade, para definir um modelo ideal capaz de expor as razões e significados dessa dualidade.

    Nessa conjuntura, na última terça-feira, apresentei um trabalho acadêmico para a conclusão do curso de filosofia na Universidade Federal do Amazonas – UFAM – que será futuramente publicado-, em que busca refletir sobre os significados da díade esquerda-direita na atualidade, com  diálogos entre textos de pensadores contemporâneos da Ciência Política, da Sociologia e da Filosofia, que discutem o tema em diferentes abordagens, como Norberto Bobbio (1995), Emir Sader (1995), Ruy Fausto (2012-2013), Bresser-Pereira (2000;2005), Anthony Giddens (2007), Chantal Mouffe (2018) e Susan Neiman (2023) que discorrem sobre a temática em perspectivas diversas,  na filosofia política, na histórica, na ecologia, nos estudos da economia, na sociologia política, no populismo e no movimento do Identitarismo.

*Sociólogo, Cientista Político e Advogado.

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